segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Corrupção: a herança de Lula*

Capas da revista Veja: a grande imprensa tem partido?


(*) Artigo publicado originalmente no Jornal da Paraíba, na edição de 16.12.2012

Quando os historiadores começarem a se debruçar sobre esse período atual da história brasileira, já consolidados os resultados do que aqui produzimos como Estado e como sociedade, é provável que seja inevitável reconhecer o grande legado que deixará Lula para as gerações futuras. 

Entre outras coisas, especialmente nesses tempos de mensalão, será preciso destacar a contribuição que o governo Lula deu ao combate à corrupção no país. 

Foi Lula quem liberou, por exemplo, as amarras que prendiam antes a Polícia Federal, seja para investigar a corrupção do próprio governo, inclusive sem poupar membros ilustres dele, seja para investigar figuras consideradas antes intocáveis, como banqueiros, grandes empresários, corruptores e sonegadores de toda espécie. 

O mesmo STF que tenta hoje ser expressão desse sentimento de moralidade pública, dobrando-se às pressões da mídia, é o mesmo tribunal que já libertou banqueiros como Salvatore Cacciola e Daniel Dantas, presos pela PF, e dezenas e dezenas de corruptos de menor estirpe.

Não esqueçamos nunca que foi Lula quem também deu plena autonomia para o Procurador Geral da República. 

Quem investigou o mensalão e ofereceu a denúncia ao STF contra membros proeminentes do governo e do PT, mesmo com provas consideradas frágeis para os crimes para os quais são acusados? 

Em tempos não muito distantes, o Procurador dessa instituição cara à República ficou conhecido pela alcunha nada edificante de “engavetador geral da república” porque nunca deu seguimento às denúncias contra o governe de então. 

E as CPIs? Quantas funcionaram durante o governo Lula, inclusive a que deu origem à crise do “mensalão”? 

Enfim, nenhum governo em qualquer época foi investigado e teve suas vísceras expostas ao público como o governo Lula, seja pela PF, seja pelo Ministério Público, seja pelo Parlamento, seja pela grande imprensa. E Lula permaneceu e permanece ileso.

Aliás, a atuação da grande imprensa certamente receberá um capítulo especial pelos historiadores que no futuro estudarem o governo Lula. 

Aqueles que se deterem num esforço de comparação perceberão com facilidade duas posturas radicalmente distintas quando o assunto for investigação de governos.

Do silêncio constrangido entre 1995 e 2002, seja diante de toda sorte de práticas dilapidadoras do Estado, como as que resultaram na privatização de gigantescas e lucrativas empresas estatais, que deu um prejuízo de bilhões ao Estado, seja pela denúncia (comprovada) de compra de votos de parlamentares na aprovação do projeto de reeleição de FHC, à turbulenta atuação denuncista entre 2003 e 2012, que procura criar uma falsa sensação de crise política e institucional permanente.

Um caso emblemático recente é o que envolve a publicização de assuntos pessoais do ex-presidente Lula, que certamente deve lhe causar dor e constrangimento porque atinge sua companheira de quase uma vida inteira, Marisa Letícia. 

Pois bem. Essa mesma imprensa que expõe a vida particular de Lula e sua “suposta” amante é a mesma que, por oito anos, sequer fez menção, aliás, corretamente, ao filho fora do casamento que o ex-presidente FHC teve com uma jornalista, reconhecido só depois da conclusão do mandato presidencial, atitude, essa sim, eticamente questionável. 

Para encobrir o que seria um escândalo, a jornalista foi transferida para Londres, onde permanece até hoje com o filho. Diante de fato como esse, a pergunta se torna inevitável: e se fosse Lula?

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Por que os recursos do petróleo devem ser destinados à educação



O impasse gerado entre os chamados estados produtores e não produtores por conta da forma como os Royalties do petróleo recentemente encontrado na camada do Pré-Sal brasileiro serão distribuídos, pode abrir uma oportunidade histórica para o Brasil e os brasileiros finalmente empreenderem um caminho sólido para um desenvolvimento com mais igualdade social.

De olho exclusivamente no aumento de suas receitas e sem uma clara discussão sobre o que fazer com elas, governadores e prefeitos se engalfinham numa disputa que não leva em conta o futuro do Brasil como nação. Como sempre, o que prevalece é uma míope visão de curto prazo que, no máximo, se projeta para o horizonte do término dos seus mandatos.

De outro lado, a sociedade brasileira talvez não tenha calculado com clareza o tamanho da riqueza que ela tem em mãos depois da descoberta do Pré-Sal: são 100 bilhões de barris de petróleo! Em reservas que permitirão a exploração por mais de 70 anos. O Brasil, que já é autossuficiente, duplicará sua produção de petróleo e se colocará entre os 10 maiores produtores.

O problema é que essa riqueza acaba, como vai acabar um dia o petróleo árabe e toda as reservas do planeta. Se não investirmos essa riqueza de maneira acertada, pensando no presente e no futuro, uma riqueza que pode gerar mais de 8 trilhões de dólares e produzir uma arrecadação de quase 2 trilhões de dólares em 70 anos, pode ir pelo ralo do mau uso do dinheiro público, seja pela forma equivocada de utilizá-lo, seja pela corrupção.

Vejam o caso paradigmático do Rio de Janeiro, que é o maior produtor de petróleo do Brasil e é responsável, sozinho, por 74% da produção petrolífera do país. Macaé e Campos são duas cidades cariocas. Esses dois municípios tem em comum, além de pertencerem ao mesmo estado, o fato de serem duas grandes cidades produtoras de petróleo do Brasil. 

Mas não é só isso. Mesmo disponde dessa riqueza, tanto Campos como Macaé se posicionam em lugares vergonhosos no ranking do IDH* (Índice de Desenvolvimento Humano): enquanto Macaé fica na 806º, Campos, que vem a ser a maior produtora de petróleo do Brasil, ocupa o 1812º.

O que vem a ser um aparente paradoxo. Mas não é, especialmente quando se trata de petróleo e, mais ainda, quando se trata de Brasil. Países que são grandes produtores de petróleo, como Nigéria e Venezuela, por exemplo, entre outros, tem uma pobreza proporcional ao tamanho de suas reservas de petróleo, ou seja, esses países não tiraram proveito do imenso potencial dessa riqueza energética para transformá-la em qualidade de vida para os seus povos, e uma minoria, aliada às grandes petrolíferas internacionais, acabaram se apropriando dessa riqueza.

No Brasil, cuja natureza do seu desenvolvimento sempre foi enriquecer concentrando renda, não é nenhuma novidade constatarmos imensos hiatos entre riqueza e pobreza, que acabam sendo faces de uma mesma moeda. Aqui, como se costuma dizer, o bolo cresceu, mas as promessas de que um dia ele vai ser melhor distribuído é sempre adiada. 

Mesmo com Lula, que melhorou a distribuição de renda, especialmente por conta de uma maior participação dos salários na formação da riqueza nacional, a desigualdade social parece ser ainda um abismo intransponível.

Por conta disso, a sociedade brasileira não pode perder a oportunidade histórica que se abriu por conta do impasse entre estados da Federação. A solução encontrada pelo Governo Federal para superar o impasse é destinar os 100% dos royalties do petróleo extraído do Pré-Sal para a educação, o que significa dobrar os gastos nesse setor que, em sete anos, pode chegar a 215 bilhões de reais a mais e atingir a meta de investir 10% do PIB em educação.
Os países que mais investem em educação, como Islândia, Noruega e Suécia, respectivamente, destinam mais de 7% dos seus PIB. 

No caso do Brasil, que ainda precisa estruturar um sistema educacional público de qualidade, especialmente nos ensinos básico e médio, as demandas são imensas e a exigência de mais recursos também, o que envolve infraestrutura das escolas, formação e salários. O fato é que, em um país que em breve será a 5ª maior economia do mundo, é inaceitável, mesmo com as melhoras verificadas nos últimos anos, que ainda ostente índices de qualidade na educação tão precários.

Portanto, o desafio é que o Congresso aprove a proposta do governo que destina 100% dos royalties do petróleo para a educação. Não podemos perder essa oportunidade. Chegou a hora de pensar no futuro, na nossa juventude e no nosso país.

*O IDH é elaborado a partir de variáveis como renda, longevidade e acesso à educação. Considerando-se esses aspectos , chega-se a uma nota que vai de 0 a 1, sendo que quanto mais próximo de 1 melhor é a qualidade de vida de um município, estado ou país. 

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Seca, poder e política*


(*) Artigo publicado originalmente no Jornal da Paraíba, na edição de 02.12.2012

Numa entrevista que se transformou em livro (Seca e Poder, Fundação Perseu Abramo, 1998), Celso Furtado é novamente chamado a tratar da seca, um tema que sempre lhe foi caro durante sua trajetória intelectual de economista interessado no desenvolvimento regional e de fundador da Sudene. 

Era o ano de 1998, governo de Fernando Henrique Cardoso, e o Nordeste “padecia”, como gostam de repetir muitos nordestinos no seu hábito de autocomiseração, mais uma seca. Mais do que do governo, Celso Furtado imputou responsabilidade à “classe política nordestina”, que, segundo ele, sempre se recusou a formular uma política para o enfrentamento dos efeitos econômicos e sociais da seca, daí a persistência deles, tão cíclica quanto a própria seca.

E esses impactos estão associados à estrutura socioeconômica do Semiárido nordestino, que pouco mudou nesses mais de 50 anos depois da criação da Sudene. As formas de propriedade da terra, por exemplo, permanecem intocadas, bem como a inexistência de mecanismo de distribuição da renda, o que pode explicar por que o Semiárido nordestino concentra parcela significativa dos pobres brasileiros. 

Não apenas isso. Pouco se fez para adaptar as práticas econômicas às condições ecológicas daquele espaço. Acumulou-se muita água, mas o desafio continua sendo distribui-la, situação que se agrava com o adensamento populacional nos centros urbanos, que demandam cada vez mais água para o consumo humano e para as atividades econômicas – é importante não esquecer que, diferentemente de outras regiões semiáridas, nós temos a região mais povoada do mundo, o que agrava ainda mais os impactos da seca.

No campo, o drama é ainda maior. O uso da irrigação é um luxo para poucos, o que torna a agricultura sujeita de maneira quase que permanente às condições climáticas. Se não chove, o desastre é certo. Na pecuária, a opção pela criação do gado bovino, uma tradição que nos acompanha desde os primeiros anos da colonização do Semiárido nordestino, ajuda ainda mais a agravar o problema no enfrentamento dos efeitos da seca. 

Enquanto que, por exemplo, para cabras e ovelhas são necessários 6 litros per capita por dia para dessedentar esses animais, uma vaca chega a consumir quase 10 vezes mais (53 litros). Além disso, o gado bovino é muito pouco resistente à seca e alimentá-lo, para pelo menos mantê-lo vivo, é um desafio difícil de ser enfrentado, daí o alto índice de mortalidade desses animais durante períodos de secas prolongadas. 

Tudo isso indica que é existem alternativas para além da pecuária bovina e que é necessário diversificar as atividades econômicas no Semiárido. Enfim, o problema da seca é, como Celso Furtado repetiu por mais de 50 anos, político. 

Por que, enfim, a seca só se apresenta como um problema quando ela está em plena vigência e os efeitos dela são tão visíveis que é impossível não nota-los? Depois de superada a seca atual, provavelmente a urgência se encerrará até que venha uma nova seca. E tudo recomeçará. Infelizmente, tem sido assim por décadas e décadas. 

A existência do Bolsa Família tem ajudado a impedir os saques a cidades e feiras, é verdade, uma prática que antes era recorrente quando uma seca acontecia. Mas, isso não basta. É preciso criar uma política de desenvolvimento que amplie e distribua a renda no Semiárido. E esse é um desafio não apenas da sociedade nordestina: tem que ser encarada como um problema nacional. E nisso, Celso Furtado continua atualíssimo.

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Equidade jurídica no "mensalão": todos são mesmo iguais perante a lei? * **

(*) Artigo publicado originalmente no Jornal da Paraíba, na edição de 08.11.2012
(**) Por conta de uma confusão de minha parte, o título do artigo que foi publicado (Seca, política e poder), deveria ter sido o que está postado acima.
  
Condenação de Dirceu e Genoíno pelo STF. E
a cidadania com isso? 
Quando a questão diz respeito à preservação de princípios caros a todos nós, especialmente aos mais fracos, não é recomendável que nos aferremos a ideologias, preconceitos políticos, ódio de classe ou puro desejo de vingança. 

Eu me refiro a equidade jurídica, um princípio fundador da sociedade moderna e uma das tantas heranças que a Revolução Francesa nos legou e que haveremos sempre de conservar. 

Princípio, aliás, consagrado em nossa Constituição, que não seria verdadeiramente democrática se não reconhecesse que “todos são iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza”.

Dito isso, eu pergunto: o princípio da equidade jurídica foi respeitado durante o julgamento do chamado “mensalão”? A sanha acusatória do moralismo político, tão ao gosto de nossas classes médias desde os anos pré-1964, atingiu seu mais alto grau, quando o que deveria ser um julgamento, em que o STF e o Ministério Público Federal aproveitassem a chance para desvendar as entranhas do nosso sistema partidário e eleitoral, principalmente buscando aperfeiçoá-lo, acabou por se tornar um deprimente espetáculo político cuja principal vítima não é outra senão a própria ideia de justiça. 

Os ministros do STF, lastimavelmente, deixaram patente que não apenas se dobram às pressões da “opinião pública” – leia-se grandes meios de comunicação, – como são adeptos de uma risível e provinciana tendência a exibicionismos intelectuais.

Pautado por interesses subalternos, o calendário do STF acabou se orientando pelo calendário eleitoral, com a apoteose – a condenação de José Dirceu – marcada para acontecer nas proximidades do segundo turno da eleição municipal que acabou de acontecer.

Entre tantas coisas, talvez a que gera hoje, e certamente continuará gerando polêmicas e efeitos na jurisprudência da justiça brasileira, seja a tese que deu suporte a todos os atos condenatórios de todos os envolvidos no mensalão: o “domínio do fato”. 

Numa síntese precária, essa teoria, desenvolvida pelo jurista alemão Claus Roxin, abre a possibilidade de, mesmo sem provas de sua participação em determinado crime, culpabilizar alguém pelo poder hierárquico exercido sobre os executores de determinado crime.

Pois bem. Foi essa tese “salvadora” que permitiu a condenação por diversos crimes de José Dirceu e de José Genoíno, Ministro Chefe da Casa Civil e Presidente do PT, respectivamente, durante as ocorrências do “mensalão”. 

Sem provas concretas contra eles, Joaquim Barbosa sacou a tese do “domínio do fato” para justificar as condenações dos dois, no que foi seguido por todos os outros ministros, à exceção Ricardo Lewandowski. 

Para constrangimento geral dos nossos “doutos” magistrados, foi o próprio Claus Roxin quem desautorizou o uso desse malabarismo jurídico, concluindo pelo “mau uso” da teoria no caso do “mensalão”. 

Segundo Roxin, em entrevista à Folha de São Paulo – realizada antes, mas só publicada depois do segundo turno, registre-se – a “posição hierárquica não fundamenta, sob nenhuma circunstância, o domínio do fato. O mero ter de saber não basta.”

terça-feira, 13 de novembro de 2012

"Mensalão": A voz das provas (artigo de Jânio de Freitas)


A voz das provas

Janio de Freitas Folha de São Paulo (13/11)

Foi uma das coincidências de tipo raro, por sua oportunidade milimétrica e preciosa. Várias peculiaridades do julgamento no STF, ontem, foram antecedidos pela manchete ao pé da pág. A6 da Folha de domingo, título de uma entrevista com o eminente jurista alemão Claus Roxin: “Participação no comando de esquema tem de ser provada”.

O subtítulo realçava tratar-se de “um dos responsáveis por teoria citada no julgamento do STF”, o “domínio do fato”. A expressão refere-se ao conhecimento de uma ocorrência, em princípio criminosa, por alguém com posição de realce nas circunstâncias do ocorrido. É um fator fundamental na condenação de José Dirceu, por ocupar o Gabinete Civil da na época do esquema Valério/PT.

As jornalistas Cristina Grillo e Denise Menchen perguntaram ao jurista alemão se “o dever de conhecer os atos de um subordinado não implica corresponsabilidade”. Claus Roxin: “A posição hierárquica não fundamenta, sob nenhuma circunstância, o domínio do fato. O mero ter que saber não basta”. E citou, como exemplo, a condenação do ex-presidente peruano Alberto Fujimori, na qual a teoria do “domínio do fato” foi aplicada com a exigência de provas (existentes) do seu comprometimento nos crimes. A teoria de Roxin foi adotada, entre outros, pelo Tribunal Penal Internacional.

Tanto na exposição em que pediu a condenação de José Dirceu como agora no caótico arranjo de fixação das penas, o relator Joaquim Barbosa se expandiu em imputações compostas só de palavras, sem provas. E, em muitos casos, sem sequer a possibilidade de se serem encontradas. Tem sido o comportamento reiterado em relação à quase totalidade dos réus.

Em um dos muitos exemplos que fundamentaram a definição de pena, foi José Dirceu quem “negociou com os bancos os empréstimos”. Se assim foi, é preciso reconsiderar a peça de acusação e dispensar Marcos Valério de boa parte dos 40 anos a que está condenado. A alternativa é impossível: seria apresentar alguma comprovação de que os empréstimos bancários tiveram outro negociador –o que não existiu segundo a própria denúncia.

Outro exemplo: a repetida acusação de que José Dirceu pôs “em risco o regime democrático”. O regime não sofreu risco algum, em tempo algum desde que o então presidente José Sarney conseguiu neutralizar os saudosos infiltrados no Ministério da Defesa, no Gabinete Militar e no SNI do seu governo. A atribuição de tanto poder a José Dirceu seria até risível, pelo descontrole da deformação, não servisse para encaminhar os votos dos seguidores de Joaquim Barbosa.

Mais um exemplo, só como atestado do método geral. Sobre Simone Vasconcelos foi onerada com a acusação de que “atuou intensamente”, fórmula, aliás, repetida de réu em réu. Era uma funcionária da agência de Marcos Valério, por ele mandada levar pacotes com dinheiro a vários dos também processados. Não há prova de que soubesse o motivo real das entregas, mesmo admitindo desde a CPI, com seus depoimentos de sinceridade incomum no caso, suspeitar de motivo imoral. Passou de portadora eventual a membro de quadrilha e condenada nessa condição.

Ignoro se alguém imaginou absolvições de acusados de mensalão. Não faltam otimistas, nem mal informados. Mas até entre os mais entusiastas de condenações crescem o reconhecimento crítico do descritério dominante, na decisão das condenações, e o mal-estar com o destempero do relator Joaquim Barbosa. Nada disso “tonifica” o Supremo, como disse ontem seu presidente Ayres Britto. Decepciona e deprecia-o –o que é péssimo para dentro e para fora do país.

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Consequências de 2012 (*)

RC, Cássio, Veneziano e Agra: 2014 passa por eles

Comecemos por Ricardo Coutinho que, sem dúvida, sofreu um importante revés depois da derrota em João Pessoa. A situação eleitoral no segundo turno foi tão desconfortável para o governador com a passagem de dois dos seus mais ferrenhos adversários, que RC foi obrigado a declara-se neutro, entre outros motivos, porque o seu apoio foi rejeitado por Luciano Cartaxo e Cícero Lucena. 

As vitorias mais importantes do PSB, entre elas Cajazeiras e Bayeux, não se deveram à força do governador, mas às lideranças locais de Carlos Antônio e Expedito Pereira. Mas, mesmo sem elas, RC continuaria a ser um forte candidato à reeleição, por mais desgastado que ele esteja nos grandes centros. Além de tempo para reverter essa situação, RC tem uma poderosa máquina que dá a qualquer governador uma imensa vantagem. 

Mas, é bom lembrar, isso por si só não basta. O exemplo de José Maranhão em 2010 ainda está bem presente na memória política dos paraibanos.

O Senador Cássio Cunha Lima saiu revigorado, especialmente depois da vitória de Campina Grande. Impossibilitado de concorrer ao governo por conta Lei do Ficha Limpa, Cunha Lima dispõe de duas opções. A primeira delas é seguir em sua aliança com o governador Ricardo Coutinho, agora numa posição mais vantajosa. Controlando a Prefeitura de Campina Grande, o ex-governador não depende mais tanto de RC e tenderá a pedir cada vez mais alto para manter-se apoiando a gestão do PSB. 

A segunda delas é lançar um candidato para cultivar seu espaço eleitoral por onde pretende retornar ao governo em 2018. A dificuldade desse projeto reside em aglutinar forças em torno de um candidato com limitada expectativa de vitória. Por isso, considero que o mais provável é a manutenção da aliança com RC.

O PT, por outro lado, ampliou bastante sua capacidade de influenciar nas disputas futuras na Paraíba, mas carece de uma liderança de peso que possa oferecer seu nome na disputa. À exceção de Luciano Agra, que parece ainda não dispor de força suficiente para participar com chances reais. 

Como o PT passou daquela fase de lançar candidatos apenas para marcar posição, e como 2014 envolve também a eleição presidencial e as alianças que lhe darão suporte nos estados, é bastante provável que o PT opte por uma aliança na Paraíba com o atual prefeito de Campina Grande, Veneziano Vital, do PMDB, aliança partidária que deve se repetir nacionalmente.

E isso nos leva ao último, mas não menos importante, ator desse processo, que é o atual prefeito de Campina Grande. Mesmo derrotado, Veneziano Vital mostrou força ao levar uma candidata desconhecida, sem experiência política e eleitoral, a um expressiva votação no segundo turno, quando ela amealhou mais de 40% dos votos, disputando com um deputado federal que, mais importante do que isso, representava a tradição da família Cunha Lima na cidade. 

Vital do Rego pertence ainda ao PMDB, a principal máquina partidária do estado e que conquistou o maior número de prefeituras em 2012, entre elas as de Patos, Sousa e Cabedelo. Além disso, Veneziano tem um atributo bastante valorizado nos candidatos , que é a juventude.

Enfim, a Paraíba tende a ver repetir as composições partidárias que se enfrentaram e dividiram meio a meio o estado nas últimas três eleições (2002, 2006 e 2010). A força adquirida pelo PT e o carisma pessoal de Veneziano Vital serão um poderoso contraponto à máquina ricardista aliada do cassismo. 

(*) Artigo publicado originalmente no Jornal da Paraíba, na edição de domingo (04.11.2012)

segunda-feira, 29 de outubro de 2012

A vitória de Cartaxo: além das contingências


A vitória de Luciano Cartaxo, do PT, promoverá importantes mudanças no quadro das disputas eleitorais do estado. A primeira delas é que o PT ascende à condição de força política com capacidade de interferir de maneira mais direta não apenas nos arranjos das composições políticas, mas nos rumos das disputas.

Até 2012, o PT foi um partido periférico na política paraibana, atuando e se mantendo na órbita dos partidos hegemônicos, fato que o levou a uma divisão interna permanente. O que dividiu o PT até o segundo turno de 2012 não foram divergências políticas de fundo, mas a acomodação dos seus vários grupos nas franjas do poder, ora do cassismo, ora do maranhismo, ora do ricardismo.

E essa situação tornou o PT paraibano um caso quase que único no Nordeste, onde a influência do “Lulismo” se apresenta de maneira mais consistente e numa região que, a cada eleição, demonstra desapego pelas lideranças tradicionais. Em 2010, muitas dessas lideranças foram derrotadas: Marco Maciel, em Pernambuco, Tasso Jereissati, no Ceará, o “carlismo”, na Bahia, todos eles pertencentes ao bloco nacional de oposição a Lula.

Na Paraíba, José Maranhão foi outra liderança que, mesmo pertencente ao bloco de apoio a Lula, foi engolida pelos ventos da ascensão de uma nova geração política, que, talvez, seja expressão de um novo tipo de eleitor. Parecer mais do que ser jovem na política consolida-se como um atributo definidor do voto, especialmente quando se tem como adversários representantes de outras gerações mais velhas. 

E em João Pessoa, nós tínhamos uma conformação no quadro de candidatos que ajudou muito a construção dessa polarização entre “jovens” e “velhos”. De um lado, Maranhão e Cícero Lucena representavam uma espécie de “tradicionalismo” político no estado. E Estela e Cartaxo, a “nova geração”, como se 2012 fosse uma continuação de 2010.

Por mais passível de questionamentos, essa divisão não é arbitrária em termos políticos . Não nesses casos, porque essa dicotomia não envolve questões ideológicas. Ela implica um novo discurso e uma nova maneira de fazer política, um desafiador esforço de entender uma mudança em pleno andamento. 

Tanto que Estela e Cartaxo só não disputaram o segundo turno porque a ascensão da candidata do PSB aconteceu de maneira tardia. Maranhão não agregou muito mais além do as pesquisas indicavam desde 2011, e Cícero Lucena, em especial, foi incapaz de ampliar sua votação, seja por razões pregressas, mas ainda bastante presentes na lembrança do eleitorado, mas, especialmente, por representar uma força política decadente no Nordeste. Quando Lucena foi para o segundo turno a eleição estava decidida antecipadamente.

E dessa mudança garacional que PSB e PT são os principais herdeiros no Nordeste, porque são eles os principais protagonistas dela. Foram de seus quadros que emergiram as principais lideranças na política nordestina nos últimos anos, que souberam expressar no discurso e na ação uma região prenhe de mudança. Eduardo Campos, Jacques Wagner, Marcelo Deda, Wellington Dias, Cid e Ciro Gomes, são nomes que representam essa nova geração de políticos nordestinos que protagonizaram esse amplo movimento de renovação política no Nordeste. 

Ricardo Coutinho foi capaz de traduzir esse sentimento em 2010, mas seu governo não é expressão dessa mudança, sendo, em muitos aspectos, conservador. Gostemos ou não, Luciano Cartaxo entra para esse seleto grupo de lideranças nordestinas, mas será só a partir de sua gestão na PMJP que será possível designar se esse projeto criará raízes e se expandirá para o resto do estado. RC está deixando a chance escapar. E Cartaxo?

Eu lembro desses fatores para não esquecermos que, além daqueles de ordem contingencial que marcam qualquer processo eleitoral, é no quadro dessas mudanças que devemos buscar explicações para vitórias eleitorais, tanto a de RC, em 2010, como a de Luciano Cartaxo, em 2012. 

No caso desse último, Cartaxo foi capaz de agregar à sua candidatura a boa avaliação da gestão de Luciano Agra e o anti-ricardismo difuso no eleitorado, mas principalmente, dos setores organizados na capital, especialmente nos servidores públicos. Mas, a sua vitória de Cartaxo vai além desses elementos conjunturais.

Quem não entender essas mudanças, que são da sociedade nordestina, será incapaz de traduzir em termos políticos o que acontece hoje na Paraíba e no Nordeste. 2010 já tinha dado o seu recado. 2012 não apenas confirmou, como expandiu os protagonistas dessa mudança, tirando de RC a primazia de sua liderança. E se ele não alterar os rumos do seu governo, pode pagar caro por isso. 

O PT tem sua chance. Vamos ver se o partido aproveita.

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Uma história, uma homenagem, uma propaganda: o Rancho da Picanha abre hoje suas portas


Anderson Medeiros, em Viena, fazendo o que ele sabe e gosta de fazer

A postagem de hoje é uma homenagem aos jovens brasileiros que saem do Brasil numa aventura em busca de oportunidades. E uma propaganda aberta de um negócio que se inicia hoje e que merece ser sucesso. Eu vou contar primeiro a história dessa homenagem, depois eu faço a propaganda.

Anderson Medeiros, que é meu amigo e primo de minha esposa, saiu de João Pessoa e foi para Miami, nos Estados Unidos, em 1996, há 17 anos, portanto. Queria trabalhar e, se possível, construir uma nova vida. Acreditava no “sonho americano” de que o trabalho conduz à riqueza. Depois de várias experiências, foi parar na churrascaria O Porcão, que levou para os americanos a experiência brasileira de comer até se empanturrar nos rodízios de carne.

No Porcão, Anderson aprendeu a preparar uma bela picanha, mas também as variadas maneiras como os americanos apreciam uma carne. Tanto que americanos se aperceberam  e compraram o passe do paraibano para o trabalho na churrascaria Texas-Brasil. O domínio desse negócio logo rendeu uma nova oportunidade e Medeiros foi parar na Carolina do Norte para ajudar a abrir uma outra churrascaria, a Chamas, que pertence a brasileiros de Goiás.

Foi na Carolina do Norte que Anderson conheceu europeus interessados em abrir churrascarias-rodízio na Europa. E, depois de uma rápida passagem pelo Brasil, Anderson Medeiros foi para a Europa para iniciar um novo tipo de trabalho: consultor e administrador de churrascarias, em que ele concebia e produzia projetos, acompanhava a construção e gerenciava esses empreendimentos até que eles ganhassem vida própria.

Com isso, deixou suas marcas por toda a Europa: na Holanda, onde ajudou no estabelecimento da churrascaria Rodízio; na Itália, concebeu o projeto da churrascaria Gaúchos; na Eslováquia, a Leblon; em Londres, a Rodízio Ricco¸e, por fim, em Viena, a churrascaria Scenário. Talvez, Anderson Medeiros estivesse ainda perambulando pela Europa não fosse o continente tragado pela crise que corrói hoje as bases da riqueza e da estabilidade política e econômica do Velho Mundo.

Picanha na chapa com acompanhamentos. V ale a pena conferir.
Anderson voltou para o Brasil e aqui pretende colocar todo o conhecimento e experiência adquiridos nesses últimos 17 anos, agora num negócio de sua própria iniciativa. Por isso, nasce hoje a churrascaria Rancho da Picanha, onde Medeiros pretende servir uma variedade de cortes, especialmente de picanha, que dá nome ao estabelecimento, todos preparados na chapa e com acompanhamentos e molhos que Anderson aprendeu por onde passou “nesse mundão de meu Deus”, como ele gosta de repetir.

Eu, que já tive a oportunidade de provar muitos deles nos churrascos que frequentei nas últimas semanas, recomendo aos meus amigos uma visita ao Rancho da Picanha. E faço isso pela qualidade do serviço, mas também em homenagem a todos os brasileiros que saem de nosso país em busca de novas oportunidades e, se são trazem riqueza quando voltam, trazem experiência e conhecimentos para conosco compartilhar.

O Rancho da Picanha abre hoje suas portas, a partir da 17 horas. Ele vai funcionar no Bessa Shopping. Anderson Medeiros espera todos de braços abertos. Eu já reservei minha mesa.

O Rancho da Picanha abre hoje, a partir da 17 horas. Ele fica no Bessa Shopping (entrada do Bessa pelo Carrefour)

domingo, 21 de outubro de 2012

Luciano Cartaxo, um homem de sorte

Luciano Cartaxo teve não apenas os braços, mas o prestígio e a votação erguidos pelo outro Luciano, o Agra. Nonato Bandeira, à esquerda, cuidou do resto.

Artigo publicado originalmente no Jornal da Paraíba, na edição de hoje (21.10.2012)

Eu costumo dizer que quando as circunstâncias conspiram a seu favor você é um indivíduo de “sorte”. Nicolau Maquiavel, o criador da filosofia política moderna, tinha uma outra maneira para designar esses acontecimentos fortuitos: fortuna, que equivale à sorte do governante ou do político. 

Entretanto, o político não pode depender apenas da sorte para conquistar e manter o poder. Ele precisa ter também virtù, que são as qualidades, as habilidades para lidar com situações difíceis e sair vitorioso delas.

Inquestionavelmente, o fato mais relevante e, diga-se de passagem, mais imprevisível para quem projetasse o futuro da disputa de 2012 em João Pessoa, imediatamente após a vitória de Ricardo Coutinho para o governo, e o resultado que hoje se prenuncia, foi a desastrada atuação administrativa e política de Coutinho no governo. 

Já fizemos referência às dificuldades administrativas do “gerentão” RC, especialmente na Capital, o que fez minguar o prestígio político do governador no seu principal e único reduto eleitoral. Quem imaginaria, em 2010, que o principal adversário de RC, dois anos depois, seria o seu principal aliado, Luciano Agra? No campo da política, a atuação do governador foi outro desastre. 

Provavelmente contando com a docilidade e fidelidade caninas de Luciano Agra, RC quis “cortar as asas” daqueles que ensaiavam rebeldia e começavam a contestar sua autoridade dentro do “coletivo” ricardista (Nonato Bandeira, Roseana Meira, Bira e Alexandre Urquiza). Primeiro, gerou dúvidas sobre a viabilidade eleitoral de Agra e, em seguida, pressionou para que ele renunciasse à sua candidatura à reeleição. 

Agra cedeu no início, mas eram claras as manifestações de descontentamento dos aliados mais próximos. Especialmente da secretária Roseane Meira, que divergia publicamente, especialmente do nome de Estelizabel Bezerra, que foi lançado quase que imediatamente à renuncia de Agra, dando a entender que essa ação já estava planejada antes. Havia um outro sinal de tensão nas hostes ricardistas: a manutenção da candidatura de Nonato Bandeira, a até então “eminência parda”, o estrategista e homem de confiança de RC.

No PPS, Bandeira estava resguardado das garras de RC. Agra, no PSB, não. E as relações no ricardismo foram se tornando tensas na medida em que ficava claro que o prefeito se recusava a comer de bom grado o prato feito a ele apresentado pelo governador. E a cada vez que Agra desistia de sua “desistência”, o confronto parecia cada vez mais inevitável. 

Nesse ínterim, Nonato Bandeira mexia os pauzinhos e uma inusitada aproximação com o PT começou a se desenhar. Enquanto o partido de Lula amansava o discurso, Agra começou a confrontar o antigo senhor dos seus desejos publicamente. A estratégia estava em andamento. Luciano Agra era agora a principal vítima de RC, mas também seu principal antagonista na capital. 

José Maranhão e Cícero Lucena acabavam de perder a hegemonia do discurso oposicionista e Agra juntava dois atributos que o tornaria praticamente imbatível: uma administração bem avaliada e de oposição ao impopular governador.

Quando Luciano Agra se apresentou no cadafalso da convenção do PSB para ser derrotado, estava definitivamente ratificado o racha. RC cometera a asneira de entregar uma prefeitura do porte da de João Pessoa nas mãos da oposição, provavelmente para não dividir poder em suas hostes. 

Não demorou muito para o prefeito anunciar sua desfiliação do partido do governador e o seu novo candidato a prefeito. Luciano Cartaxo, cuja intenção inicial era apenas se projetar durante a disputa para alçar novos voos no futuro, acabava de ganhar de presente uma máquina administrativa poderosa e azeitada para fazer campanha, que compensava em muito a mudança repentina do discurso oposicionista. 

Luciano Cartaxo viu as circunstâncias conspirarem a seu favor, pois é inquestionável que sem as decisões de Agra e Nonato Bandeira seu destino tenderia a ser outro. Cartaxo tem a fortuna a seu lado. Resta saber se ele tem virtù para no futuro não depender tanto da sorte.

domingo, 14 de outubro de 2012

PARA ENTENDER O JULGAMENTO DO “MENSALÃO”

Por Fábio Konder Comparato, via Conversaafiada.com.br

Ao se encerrar o processo penal de maior repercussão pública dos últimos anos, é preciso dele tirar as necessárias conclusões ético-políticas.

Comecemos por focalizar aquilo que representa o nervo central da vida humana em sociedade, ou seja, o poder.

No Brasil, a esfera do poder sempre se apresentou dividida em dois níveis, um oficial e outro não-oficial, sendo o último encoberto pelo primeiro.

O nível oficial de poder aparece com destaque, e é exibido a todos como prova de nosso avanço político. A Constituição, por exemplo, declara solenemente que todo poder emana do povo. Quem meditar, porém, nem que seja um instante, sobre a realidade brasileira, percebe claramente que o povo é, e sempre foi, mero figurante no teatro político. 

Ainda no escalão oficial, e com grande visibilidade, atuam os órgãos clássicos do Estado: o Executivo, o Legislativo, o Judiciário e outros órgãos auxiliares. Finalmente, completando esse nível oficial de poder e com a mesma visibilidade, há o conjunto de todos aqueles que militam nos partidos políticos.

Para a opinião pública e os observadores menos atentos, todo o poder político concentra-se aí.

É preciso uma boa acuidade visual para enxergar, por trás dessa fachada brilhante, um segundo nível de poder, que na realidade quase sempre suplanta o primeiro. É o grupo formado pelo grande empresariado: financeiro, industrial, comercial, de serviços e do agronegócio.

No exercício desse poder dominante (embora sempre oculto), o grande empresariado conta com alguns aliados históricos, como a corporação militar e a classe média superior. Esta, aliás, tem cada vez mais sua visão de mundo moldada pela televisão, o rádio e a grande imprensa, os quais estão, desde há muito, sob o controle de um oligopólio empresarial. Ora, a opinião – autêntica ou fabricada – da classe média conservadora sempre influenciou poderosamente a mentalidade da grande maioria dos membros do nosso Poder Judiciário.

Tentemos, agora, compreender o rumoroso caso do “mensalão”.

Ele nasceu, alimentou-se e chegou ao auge exclusivamente no nível do poder político oficial. A maioria absoluta dos réus integrava o mesmo partido político; por sinal, aquele que está no poder federal há quase dez anos. Esse partido surgiu, e permaneceu durante alguns poucos anos, como uma agremiação política de defesa dos trabalhadores contra o empresariado. Depois, em grande parte por iniciativa e sob a direção de José Dirceu, foi aos poucos procurando amancebar-se com os homens de negócio.

Os grandes empresários permaneceram aparentemente alheios ao debate do “mensalão”, embora fazendo força nos bastidores para uma condenação exemplar de todos os acusados. Essa manobra tática, como em tantas outras ocasiões, teve por objetivo desviar a atenção geral sobre a Grande Corrupção da máquina estatal, por eles, empresários, mantida constantemente em atividade magistralmente desde Pedro Álvares Cabral.

Quanto à classe média conservadora, cujas opiniões influenciam grandemente os magistrados, não foi preciso grande esforço dos meios de comunicação de massa para nela suscitar a fúria punitiva dos políticos corruptos,  e para saudar o relator do processo do “mensalão” como herói nacional. É que os integrantes dessa classe, muito embora nem sempre procedam de modo honesto em suas relações com as autoridades – bastando citar a compra de facilidades na obtenção de licenças de toda sorte, com ou sem despachante; ou a não-declaração de rendimentos ao Fisco –, sempre esteve convencida de que a desonestidade pecuniária dos políticos é muito pior para o povo do que a exploração empresarial dos trabalhadores e dos consumidores.

E o Judiciário nisso tudo?

Sabe-se, tradicionalmente, que nesta terra somente são condenados os 3 Ps: pretos, pobres e prostitutas. Agora, ao que parece, estas últimas (sobretudo na high society) passaram a ser substituídas pelos políticos, de modo a conservar o mesmo sistema de letra inicial.

Pouco se indaga, porém, sobre a razão pela qual um “mensalão” anterior ao do PT, e que serviu de inspiração para este, orquestrado em outro partido político (por coincidência, seu atual opositor ferrenho), ainda não tenha sido julgado, nem parece que irá sê-lo às vésperas das próximas eleições. Da mesma forma, não causou comoção, à época, o fato de que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso tivesse sido publicamente acusado de haver comprado a aprovação da sua reeleição no Congresso por emenda constitucional, e a digna Procuradoria-Geral da República permanecesse muda e queda.

Tampouco houve o menor esboço de revolta popular diante da criminosa façanha de privatização de empresas estatais, sob a presidência de Fernando Henrique Cardoso. As poucas ações intentadas contra esse gravíssimo atentado ao patrimônio nacional, em particular a ação popular visando a anular a venda da Vale do Rio Doce na bacia das almas, jamais chegaram a ser julgadas definitivamente pelo Poder Judiciário.

Mas aí vem a pergunta indiscreta: – E os grandes empresários? Bem, estes parecem merecer especial desvelo por parte dos magistrados. 

Ainda recentemente, a condenação em primeira instância por vários crimes econômicos de um desses privilegiados, provocou o imediato afastamento do Chefe da Polícia Federal, e a concessão de habeas-corpus diretamente pelo presidente do Supremo Tribunal, saltando por cima de todas as instâncias intermediárias.

Estranho também, para dizer o mínimo, o caso do ex-presidente Fernando Collor. Seu impeachment foi decidido por “atentado à dignidade do cargo” (entenda-se, a organização de uma empresa de corrupção pelo seu fac-totum, Paulo Cezar Farias). Alguns “contribuintes” para a caixinha presidencial, entrevistados na televisão, declararam candidamente terem sido constrangidos a pagar, para obter decisões governamentais que estimavam lícitas, em seu favor. E o Supremo Tribunal Federal, aí sim, chamado a decidir, não vislumbrou crime algum no episódio.

Vou mais além. Alguns Ministros do Supremo Tribunal Federal, ao votarem no processo do “mensalão”, declararam que os crimes aí denunciados eram “gravíssimos”. Ora, os mesmos Ministros que assim se pronunciaram, chamados a votar no processo da lei de anistia, não consideraram como dotados da mesma gravidade os crimes de terrorismo praticados pelos agentes da repressão, durante o regime empresarial-militar: a saber, a sistemática tortura de presos políticos, muitas vezes até à morte, ou a execução sumária de opositores ao regime, com o esquartejamento e a ocultação dos cadáveres.

Com efeito, ao julgar em abril de 2010 a ação intentada pelo Conselho Federal da OAB, para que fosse reinterpretada, à luz da nova Constituição e do sistema internacional de direitos humanos, a lei de anistia de 1979, o mesmo Supremo Tribunal, por ampla maioria, decidiu que fora válido aquele apagamento dos crimes de terrorismo de Estado, estabelecido como condição para que a corporação militar abrisse mão do poder supremo. O severíssimo relator do “mensalão”, alegando doença, não compareceu às duas sessões de julgamento. 

Pois bem, foi preciso, para vergonha nossa, que alguns meses depois a Corte Interamericana de Direitos Humanos reabrisse a discussão sobre a matéria, e julgasse insustentável essa decisão do nosso mais alto tribunal.

Na verdade, o que poucos entendem – mesmo no meio jurídico – é que o julgamento de casos com importante componente político ou religioso não se faz por meio do puro silogismo jurídico tradicional: a interpretação das normas jurídicas pertinentes ao caso, como premissa maior; o exame dos fatos, como premissa menor, seguindo logicamente a conclusão.

O procedimento mental costuma ser bem outro. De imediato, em casos que tais, salvo raras e honrosas exceções, os juízes fazem interiormente um pré-julgamento, em função de sua mentalidade própria ou visão de mundo; vale dizer, de suas preferências valorativas, crenças, opiniões, ou até mesmo preconceitos. É só num segundo momento, por razões de protocolo, que entra em jogo o raciocínio jurídico-formal. E aí, quando se trata de um colegiado julgador, a discussão do caso pelos seus integrantes costuma assumir toda a confusão de um diálogo de surdos.

Foi o que sucedeu no julgamento do “mensalão”.

domingo, 7 de outubro de 2012

O “NOVO”, DE NOVO?

O "novo" na política: farsa e tragédia


Artigo publicado originalmente no Jornal da Paraíba, na edição de hoje (07.10.2012) 

Estou com uma forte de sensação de déjà vu, aquela expressão francesa que indica uma falsa sensação de familiaridade no presente com fatos ocorridos no passado. É como se tudo estivesse novamente acontecendo. 

Nem bem João Pessoa saiu de uma disputa eleitoral em que um dos candidatos fez do “novo” um poderoso mote de campanha e que, vencida a eleição, revelou-se uma farsa no governo, a cidade vê esse discurso ser retomado como se fosse uma grande novidade. Aqui, é inevitável a lembrança de uma célebre frase de Karl Marx, segundo quem a história só se repete duas vezes: uma como farsa, outra como tragédia.

Em 2010, embebidos pelo fetiche do “novo”, como se este tivesse qualidades superiores por si só, o eleitorado paraibano embarcou numa aventura sem observar para que caminhos ela nos levava. E as ilusões da novidade se dissiparam com a mesma rapidez com que foi construída. 

Uma das características do atual Governador da Paraíba, e que marcam poderosamente o seu governo, é negar suas ideias e aquilo que se imaginava ser seus princípios. Ricardo Coutinho é oriundo do sindicalismo da área da saúde, cuja marca sempre foi a defesa e o fortalecimento do SUS. 

Não só isso. Ele era um ferrenho crítico do “neoliberalismo” e da “privatização do Estado”. Pois bem. Nem bem assumiu o governo, e para espanto geral, uma das suas primeiras ações foi transferir para iniciativa privada a administração do estratégico Hospital de Traumas da capital, e depois de toda rede hospitalar estadual. 

Defensor da “republicanização do Estado”, foi dele a iniciativa de repassar para um dos maiores empresários da Paraíba um valiosíssimo terreno, sem dar a mesma oportunidade a outros empresários que tinham o mesmo interesse. Negócio entre amigos? Quer coisa menos republicana do que isso? 

Além disso, não reconheceu a eleição de diversos diretores de escolas eleitos e tratou com spray de pimenta os estudantes que protestavam contra esse ato. De aliadas, passou a tratar como inimigas diversas categorias de servidores que esperavam um tratamento à altura das promessas e das suas próprias expectativas. Eis o “novo” prometido, pulsante, real, verdadeiro. Eis a farsa.

Em 2012, a promessa do “novo” para João Pessoa volta com todo o gás, num esforço de repetição histórica, como se o povo não aprendesse com seus próprios erros, como se a memória, mesmo a de curto prazo, fosse tão volúvel quanto a trajetória desse candidato.  

E o novo parece ser bem modernoso. Engomadinho em paletós bem cortados, cabelos bem penteados, discurso previsível e “equilibrado”, só falta fazer exercícios em frente às câmeras, como apreciava um ex-presidente, também um “jovem”, cassado por corrupção. 

Só que o novo de 2012, assim como o de 2010, não é tão novo assim. Tem 20 anos de vida pública, assim como o último, de quem inclusive foi líder na Câmara Municipal. Adaptável como tudo que é “novo” nesse início de século pós-moderno, e esteve em todos os lados, como um camaleão que se encaixa na paisagem e se torna imperceptível. 

Suas opiniões são expressão de um mundo em transformação e, como tal, mudam também com incrível rapidez. De crítico incisivo, que tachou de corrupta a atual administração, quer agora dar-lhe continuidade. Raul Seixas diria ser ele uma “memorfose ambulante”. Estamos prestes a ver a farsa se transformar em tragédia? Espero que não.

Por isso, estou farto de tanta “novidade”. Deixem-me com a previsibilidade dos princípios e da experiência, ancorada numa trajetória que me dá segurança de que não serei enganado. É disso que eu preciso hoje.

Em tempo: Existe mais um elo a ligar o "novo" de 2010 ao "novo" de 2012. Ele atende pelo nome de Nonato Bandeira, que foi o homem forte e principal estrategista da campanha e do governo de RC, agora ocupando o mesmo espaço com os Lucianos. É atribuída a ele a até então nunca vista perseguição a muitos jornalistas que não votaram em RC em 2010, inclusive com pedidos públicos de suas cabeça pela Primeira Dama do estado, Pâmela Bório. Muitos deles perderam seus empregos devido à contumaz genunflexão dos empresários da comunicação da Paraíba aos caprichos do poder. E eis que Nonato volta, com todo o gás, e tudo se perde nesse mundo de novidades, e tudo se esquece, nesse mundo presentista e sem memória.

sábado, 6 de outubro de 2012

Porque decidi votar em José Maranhão II



José Maranhão é um político de outra geração. Isso, na política atual, que parece uma obviedade, tem um significado muito particular, especialmente quando comparamos a geração nascida e formada politicamente antes de 1964 com aquela do pós-Golpe Militar, ou seja, daqueles que entraram na política pós-1985, e a qual pertence todos os outros candidatos a prefeito de João Pessoa.

A geração pós-golpe é a geração proveniente de um hiato, um hiato de 21 anos de ditadura, portanto, de uma geração de referências políticas moldadas no autoritarismo que impediu o livre debate de ideias sobre os grandes temas do Brasil, especialmente a questão agrária e a dependência . Já a geração pré-64 é a geração do pós-Segunda Guerra, do nacionalismo, numa conjuntura que não poderia ser outra coisa a não ser de esquerda, do desenvolvimentismo, da Petrobrás, que desaguou no grande debate nacional sobre a necessidade das “reformas de base”.

Essa geração que entrou para a política no imediato pós-64 é a geração do Brasil urbano e industrial, da nova classe média e da nova classe operária, da moderna agricultura do “agronegócio” e do pleno desenvolvimento do capitalismo no campo, e a geração da modernização conservadora, que já nasce em plena era televisiva, na qual o marketing é o expoente máximo. É a geração que vai assistir o desenrolar final da crise e do fim da União Soviética e da Guerra Fria, sendo, portanto, a geração do “fim da história” e da plena hegemonia do militarismo norte-americano, cujo sintoma intelectual mais sensível e o da crise do marxismo. É a geração que vive o nascimento da hegemonia neoliberal e do pensamento único, e de uma esquerda em crise de identidade e de paradigma. Essa é a geração de Cícero Lucena, de Estela Bezerra e de Luciano Cartaxo.

A geração que entrou para a política no imediato pós-Segunda Guerra é a geração de um Brasil que começava seu impulso de industrialização e de urbanização. É a geração que viveu intensamente o debate sobre a necessidade da reforma agrária e de uma industrialização de bases nacionais, cuja campanha do Petróleo é Nosso, que mobilizou a juventude da época, é expressão máxima. É a geração do rádio e do comício, onde a palavra, e não a imagem, era mais importante. É a geração da expansão soviética e da Guerra-Fria, do embate mundial entre dois sistemas socioeconômicos (capitalismo X socialismo), da Revolução Chinesa, da Guerra do Vietnã e, particularmente, da Revolução Cubana, do nacionalismo e do imperialismo, das Ligas Camponesas. É a geração da maior efervescência política e cultural que o Brasil já viveu. Essa é a geração de José Maranhão.

E José Maranhão foi formado politicamente nesse período e foi vitima de suas opções. Filiado ao PTB varguista, José Maranhão se considera um nacionalista e um desenvolvimentista, e por isso foi cassado pelos militares. José Maranhão tinha um lado nesse embate de proporções históricas para o Brasil que aconteceu na década de 1964. Filiado ao MDB, único partido de oposição ao regime, Maranhão foi cassado pelo AI-5, em 1969, e ficou sem direitos políticos até 1979, com a Lei da Anistia, e manteve sua filiação ao MDB, agora PMDB. É dessa trajetória que provem a amizade com Antônio Mariz, político que a Paraíba sempre reverenciou e da qual resultou na escolha de Maranhão para seu candidato a vice-governador, 1994.

Por que a referência geracional para justificar uma escolha eleitoral? A resposta nós podemos encontrar nos candidatos a prefeito de João Pessoa e em seus vai-e-vens políticos e ideológicos. Num ambiente cuja marca é a completa ausência de coerência com suas posições anteriores e com sua trajetória, pela opção por um pragmatismo sem limites quando se trata de projetos e alianças, José Maranhão é aquele candidato que, por sua experiência e por sua trajetória, nos transmite maior confiança e consistência.

Por isso, amanhã, meu voto é José Maranhão.

terça-feira, 2 de outubro de 2012

PORQUE DECIDI VOTAR EM JOSÉ MARANHÃO I


Eu poderia começar esboçando uma justificativa fazendo menção aos motivos pelos quais não voto nos outros candidatos a prefeito de João Pessoa. Mas, não, não vou fazer isso. Eu perderia muito tempo e sobraria menos espaço para tratar de expor as razões que me levaram a optar pela candidatura José Maranhão nessa eleição de 2012.

José Maranhão é o candidato mais consistente. A consistência de um político deve ser buscada não apenas nos seus discursos ou nas suas propostas. Mais do que isso, esse atributo deve ser medido pelas suas ideias mais gerais a respeito da Paraíba e do Brasil. É isso que orienta – ou deveria orientar – a prática política.

Nesse sentido, José Maranhão, com erros e acertos, foi capaz de expressar isso em suas administrações, por exemplo, no governo do estado. Para não me alongar muito, eu cito apenas um exemplo. A visão estratégica no enfrentamento da problemática da água para consumo humano e para as atividades econômicas.

Alguém tem dúvida que, afora as questões de ordem estruturais (econômica e social), esse vem a ser o grande e principal dilema da Paraíba? Com o adensamento populacional crescente nos centos urbanos e uma agricultura frágil para cumprir o seu papel econômico e social, o problema não apenas da ampliação da capacidade de acumular água em açudes e barragens, mas também da ampliação do acesso através da distribuição, tornam-se questões estratégicas.

Por isso, uma das ações estruturantes de maior relevância dos governos de José Maranhão vem a ser o que ele chamou de “Plano das águas”, um grande projeto de construção de novos reservatórios, associado à construção de adutoras para distribuir a água acumulada para regiões com déficit hídrico. Esse grande projeto promoveu grandes impactos na melhoria das condições de vida e de desenvolvimento econômico da Paraíba.

Vejam o caso de Patos, uma cidade com mais de 100 mil habitantes, incrustada em pleno semiárido paraibano. Enquanto as águas do açude de Coremas escorriam para o Rio Grande do Norte ou se perdiam pela evaporação, Patos padecia ano após ano em racionamentos de água cada vez mais prolongados. Foi a construção da adutora Patos-Coremas que salvou a capital do Sertão, literalmente, viabilizando tanto água para o consumo humano quanto para atividades econômicas.

E tantos outros exemplos de barragens e adutoras espalhadas por todo o estado e cujo impacto socioeconômico só será medido com exatidão no futuro, a exemplo de outra “transposição” de águas para irrigar as várzeas de Sousa, o chamado Canal da Redenção, um canal adutor de 37 Km, com túneis, sifões e galeria que visavam irrigar mais de 5.000 ha, o que poderia ter tornado aquela região num polo de fruticultura irrigada. Interrompido no governo de Cássio Cunha Lima, que o desfigurou por completo, não apenas ao impedir sua continuidade, como ao alterar substancialmente a lógica econômica do projeto, transferindo lotes de terra para grandes proprietários, especialmente grandes empresários do ramo da fruticultura, ao invés de priorizar os pequenos produtores.

Esse exemplo mostra tanto a visão “desenvolvimentista” que José Maranhão sempre tentou empreender em seus governos, como mostram – apesar de muitos acharem, erroneamente, que não existem – diferenças fundamentais entre dois importante políticos paraibanos, um deles aliado do atual governador, cuja consistência de ideias não resistiu a três meses de governo.

Num ambiente político marcado pelo excesso de pragmatismo e de desprezo pelo debate de ideias, onde o que menos importa são as alianças políticas – quem pode afirmar com convicção que o que o candidato do PT diz hoje sobre Ricardo Coutinho será mantido daqui a um ano? – José Maranhão tem a sua trajetória para demonstrar sua consistência como político e como pessoa. E isso, para mim, é um traço fundamental para minha escolha.
Depois eu volto para tratar da história e da trajetória de José Maranhão.

terça-feira, 25 de setembro de 2012

As pesquisas e suas utilidades

Artigo publicado originalmente no Jornal da Paraíba de 23.9.2012

É cada vez mais patente que na disputa de João Pessoa as pesquisas eleitorais são parte importante nas estratégias eleitorais dos candidatos, especialmente daqueles que dispõem de mais recursos e meios para utilizá-las com esse objetivo. 

Seja para criar a sensação de crescimento na preferência do eleitorado, que sempre presta mais atenção em candidato bem avaliado ou em crescimento nas pesquisas, como na escolha dos adversários no segundo turno. 

Trata-se daquela sentença que é repetida como um mantra pelos apoiadores de certos candidatos e certos "analistas políticos": tal candidato já está no segundo turno.  Mesmo que essa certeza não seja corroborada pelas pesquisas, pois até agora nenhum candidato se descolou o suficiente na liderança para que isso seja afirmado com convicção. 

Não por acaso, esse candidato (o escolhido) é o mais fácil de ser derrotado no segundo turno, pois é o que menos agrega apoio e tem maior rejeição no eleitorado. Então, ficamos diante da seguinte situação: já que temos três candidatos dispuntando duas vagas para o segundo turno, e um já está lá, resta descobrir quem será o outro. As pesquisas dão uma "dica": um está em ascensão e o outro em descenso. Em qual você apostaria? 

E o recurso para tanta manipulação é o da margem de erro, que eu tenho descrito como "mágica" eleitoral, pois dependendo dela uma diferença de 7% ou 8% percentuais pode ser transformada em "empate técnico". E dentro disso cabe tudo. 

Ora, se um intervalo de confiança aceitável é de 95%, os outros 5% configurariam toda extensão da margem de erro (2,5% para cima e 2,5% para baixo). Em João Pessoa, a maioria dos institutos - pelo menos aqueles que fazem pesquisas "encomendadas" - utilizam margens de erro que superam em muito os 2,5%. Alguns chegam aos 4%! O resultado disso é óbvio. 

Por exemplo. Uma pesquisa com uma margem de erro de 3,5% significa que um candidato pode ter mais ou menos 3,5% dos votos aferidos. Portanto, se numa pesquisa um candidato tem 20% e ou outro 13%, estamos diante de um "empate técnico". 

Isso é que eu tenho chamada de "a mágica da margem de erro", um mágica política que só as pesquisas eleitorais são capazes de promover. A vários dias da eleição, quem pode dizer se uma pesquisa está ou não correta? Ninguém. 

Entretanto, se os números delas não batem com os das urnas, é sempre possível culpar a "metododologia", que precisa ser aperfeiçoada. E assim, la nave vá.  

Mas, mesmo diante dos imperativos da margem de erro, há sempre aqueles que, fazendo-se de desavisados, as desconsideram para criar determinada situação. Foi o que eu observei na divulgação da pesquisa realizada pelo portal WSCOM. Com margem de erro anunciada de 2,5%, os números foram os seguintes: Luciano Cartaxo com 21,9%, Cícero Lucena com 21,3%. e José Maranhão 17,8%. 

Não precisa ser estatístico mas perceber que, considerando a margem de erro, existe um empate técnico entre o 1º e o 3º No limite, Cartaxo teria 19,4% e Maranhão 20,3% (quase 1%!). Entretanto, essa foi a manchete do portal: "Pesquisa WSCOM/6Sigma aponta empate técnico entre Cartaxo e Cícero". E só quem ganha a fama é o IBOPE...